sexta-feira, 7 de julho de 2017

queimando as páginas

decidi não acordar mais
só pra ficar sonhando com quem já fui
desapareci dos becos, da sala de aula e do carnaval
tentei fugir da tua boca, fumar o teu cigarro
tuas bocas parecem deus perto
pulei a fogueira apagada
e as brasas encontraram meus sonhos acesos
os sonhos de mim
quem sou não importa, meu bem
nem tampouco o que me torno
e tudo em torno
encontro a melhor rua para tua fuga
te convido para um chá
me deixa em paz já que te amo e grito para mim
te amo ano após amo
é uma pena que você vaga a mesma merda
os anjos mijam sobre nossas cabeças
já tive medo passando pelos meus rascunhos
e o vento trouxe de volta o animal
"quando todos vão embora eu me tranco aqui e tudo bem"
para você escrevo
que sempre estive onde
você não procura e
não me empresto pra você.

Pierre Tenório

quarta-feira, 5 de julho de 2017

queria mudar a cabeça dos homens
não pedir para eles pensarem tanto
só queria que ficassem sozinhos
e tirassem a gravata que enforca
seus pescoços
queria arrancar a cabeça
dos homens
colocar um corpo de mulher
assim eu poderia tirar-lhes a barba
fio por fio
como uma máquina de desfazer medos
queria colorir a boca dos homens
e me apaixonar como um animal
selvagem
esquecê-lo para sempre sempre
mudar de calçada toda vez
que avistasse um homem
para vê-lo passar divagando
como nunca vi devagar
eu queria ser um cachorro
com o rabo entre as pernas

tp

terça-feira, 4 de julho de 2017

venho tentando
trepar em você
esse foi o último
atentado que me
lancei arriscar

tirar um espinho
de alguma flor
que estava enganchada
pelos teus cabelos

ao querer entrar
dentro das raízes
dessas tuas terras

férteis cicatrizes
lágrimas desertas
comer tuas pétalas

Pierre Tenório

terça-feira, 27 de junho de 2017

Não tente beijar um poema

da última vez que tentei
beijar um poema
ele pediu para
que eu me afastasse

de mim

sem precisar me tocar

disse que para beijá-lo
eu deveria saber
o quanto pesa uma alma
diante do universo.

Pensei que seria impossível
beijar o poema um dia
tocar os meus lábios no corpo
do poema, que ria

mesmo que não tenha corpo
nem rima, mesmo que não tenha alma
não tenha

Eu disse para o poema
que estava a escrever
no momento do desejo
pelo beijo

este mesmo que estais lendo

- sou apenas quem não sou
e estou com tua alma
só não sei como ela cabe
no bolso da minha calça

o poema desmaiou
no fundo do meu abraço
não havia mais sorriso
nem cor alguma em seus lábios

Nunca tente beijar um poema

seja apenas quem você não é
e a poesia te come
como quem não quer

o poema não te beija
também não faz questão nenhuma de você.

Isso não é um conselho
é apenas um falso testemunho

Pierre Tenório

terça-feira, 13 de junho de 2017

peço desculpas por não ser
um poeta como você come

sou pecador acíduo

odeio quando a fumaça passa
despercebida

amo os meus ódios
cheios de olhos

fechados

abro as cortinas da razão
e a paisagem não é bonita

mentiras são nãos
de óculos quebrados

e bocas amordaçadas

as fachadas dos lugares
nos condenam a mesmice

das verdades esfarrapadas;

mergulho meu corpo cego e
a terra entre os meus dedos

colorem o universo
de um rio que vive sozinho.

distante cavo profundo
pra ver se encontro teu mundo.

onde finalmente eu possa me perder em paz

Pierre Tenório

terça-feira, 6 de junho de 2017

Mesmo antes de dormir
eu já sabia
que não acordaria

com saudades de nada

fui esquecendo
letra por letra do que não escrevi

fui deixando a contagem
das moedas
por minha conta

fui e não precisei voltar

visitei outros capítulos
sem decorar o que estava escrito
sobre o vento.

Comprei um  e vinte e cinco
de pães franceses,

tá muito caro o pau Brasil
tá muito raro o pão

quase irreal.

Sonhei que os índios
queimavam os ternos

e a ternura reinou dentro do sono
tranquila
em vigília;

mataram o presidente
mataram quem representava o presidente
mataram quem representava o representante do presidente.

Acordei com saudades
e não tenho tempo para matar
minha fome.

Pierre Tenório

sábado, 27 de maio de 2017

Não quero resolver nada
não sei por onde termino
nem sei a primeira palavra

tenho inventado maus hábitos
também corrido perigo
me sinto presa neste país

presa fácil
sem crime

Perdi a noção do belo
perdi a tranquilidade do poema

parece que nada
precisa de ordem
que tudo é capaz
de lavar as almas

Não queria que a primeira
palavra deste poema
fosse tudo que tenho
em segredo.

E mesmo que fosse possível
eu afastar-me de mim
permaneceria do vão da dúvida
pensando no sim.

Pierre Tenório