domingo, 28 de agosto de 2016
transcendo entre estar
com barba e sem ela
gosto quando o cheiro
penetra profundamente
dentro dos buracos
das minhas narinas
sinto frio quando a corto
o rosto soa delicado
feminino, quase impecável.
nada melhor que uma barba
mal feita ao alcance das mãos
para um cafuné com café,
cerveja em um dia qualquer
com beleza e a leveza
de olhos fechados
pelos apelos
beijos roubados
há uma cicatriz
debaixo da barba
uma lembrança falha
de alguma espada.
Pierre Tenório
domingo, 21 de agosto de 2016
a geração mais infeliz que ouvimos falar
compramos sorrisos em bocas de fumo
a fumaça não alcança a medida das balanças
justiça cansada
o amor saiu correndo pra bem perto
das nossas luvas sem mãos
a tv desligou sozinha
os corações são azuis
vagando por céus acinzentados
palavras continuam bonitas
o natal ainda é em dezembro
produzimos obras de arte
para ilustrar desodorantes
que afagam nossos sovacos
abraços continuam baratos
narizes mais entupidos
o cigarro aumentou de preço
e maconha ainda proibida
plantamos desejos em pedras de gelo
e o telefone descarregou.
mas, pense bem.
colocamos todo nosso ar
em balões multicoloridos
buscando sorrisos gratuitos
em festas de aniversário
num dia qualquer de domingo
compomos músicas surpresas
para ouvidos doloridos
ignoramos boas tardes
enquanto nos perdemos
limpando toda casa.
a vida continua bagunçada
Pierre Tenório
quarta-feira, 17 de agosto de 2016
quinta-feira, 11 de agosto de 2016
parecia cabisbaixa
um pouco feliz em me ver
nunca a vi tão bonita, cada vez que some
ao voltar está mais bonita
embora nunca volte
fria
dizia-se preocupada com o país
cortaram as bolsas da universidade
a casa estava uma bagunça
a casa sempre estava uma bagunça
eu gostava da bagunça
o cheiro dali lembra coisas bonitas
cheiro de incenso
o cheiro dela
alguns desenhos espalhados
modelos vivos
mortos
posei algumas vezes para foto
somente para ela gostar
fingia sempre gostar
todo mundo de humanas se une
pra fazer essa coisa de arte
nos cantos, nos corpos, nos cus
eu gosto de esperar o ônibus
sentindo o cheiro do recife
enquanto a cidade chove
e voltamos para casa
e para de chover
e eu volto pra minha casa
essa é a minha relação com a arquitetura
o cheiro.
fumamos alguns baseados, era o último dia
daquele meu feriado, olhamos o mar fumando o sol
ela disse que vai dividir ap com um povo de cinema
que conheceu ontem e vender brownie e o que der
pelos cantos dos cantos dos cantos
termina o curso em um ano
foi despejada e quer um papel
num filme de baixo orçamento
o tempo parece somente
passar para mim que eu não posso
voltar
a acho uma ótima atriz
embora não consiga mentir direito
aquela loucura convence
amo aquela loucura
de se descobrir descobrir
fiquei na rodoviária
esperando por um bom tempo
bons tempos
onde nunca precisaremos
negar eu te amos
voltei pro interior
do interior
do interior
com fones nos ouvidos.
Pierre Tenório
domingo, 7 de agosto de 2016
perdão, não consigo correr
nos caminhos que fazem te achar
a distância é maior que a grana
que tenho para gastar;
não possuo pernas de atleta
nem ao menos bicicleta.
o amor já entregou as asas
que tinha para doação
tento escrever um poema
que sirva de condução;
mas, ele não suporta o peso
de não poder sentir cheiro.
com balões agarrados as mãos
e tijolos amarrados aos pés
sinto o mundo dar voltas
cavalgando em carrosséis;
na esperança de te rever
ao menos pela tv.
Pierre Tenório
sexta-feira, 5 de agosto de 2016
bem que te kiss;
disseste
kiss me, bem
meu bem, quiseste
reencontrar
dentro do jeito
meu paladar
roubando tempo
para escutar
tudo que importa
você calar
alguma coisa.
olhando ao canto
entra no olho
pra que eu possa
fingir não saber
reagir bem
fazer de você
o único bem
que possa esquecer.
escreverei alguma canção
onde possa te dizer, não.
como alguém que já aprendeu
nunca dar ouvidos aos olhos
melhor rasurar um poema
que nunca será entendido
do que declamá-lo pra sempre
em rodas de tempo perdido;
não hei de rasgar nossos medos
um sentimento que diz tudo
para qualquer ouvinte surdo.
Pierre Tenório
terça-feira, 2 de agosto de 2016
posso ter um piripaque.
Atravessar a rua na hora errada.
Pegar a estrada certa e dar de cara com o equilibrista,
ambos morrendo de medo.
Um policial pode me confundir com um homofóbico
e matar o homofóbico. Tenho medo de policiais, principalmente
homofóbicos.
Alguém pode me matar porque esqueci meu telefone em casa.
Ou porque entreguei meu samsung galaxy 2000.
Alguém pode surtar e sair atirando por aí, decerto eu estaria
no meio da pista.
Tem gente que morre de amor pra dar sem ter a quem, com tanta gente, bicho,
bicha.
Tem gente que morre pelo outro, taí, acho bonito.
Tem gente que não morre por séculos e séculos, amém.
Esse papo de morte parece mórbido, mas, não.
Gente morta-viva me deixa triste.
Só pensei em morte porque estava a pensar em coisas frágeis.
Atiraram em mim pensando que eu era negro, mas, não morri não.
Atiraram na minha fragilidade, mas, a bala pegou de raspão.
Pensei em nunca mais sair de casa.
E o médico me disse que tenho um tumor no cérebro.
Pensei: Tá brincando.
Me fiz um cafuné. Abri um vinho e suspirei profundo
afagando a textura do tecido do braço do sofá,
quase como a um filho.
Assisti a madrugada esperando o último ônibus de volta
para algum lugar.
Liguei pro meu amigo e pedi para ele curtir minha foto.
Abracei a querida cachorra que mora na calçada e está doente
pois quase a mataram também.
Ninguém matou meu amor por amar as coisas sobre todos os deuses.
Doei todas as minhas coisas. As roupas também.
Saí andando nua pela rua e fui detida por atentado.
Nunca pensei que seria terrorista.
Senti frio na alma. Sabe esses clichês de cinema e poesia?
Você olha a paisagem e sente exatamente.
Até hoje ninguém sabe como morri.
Só sei que existem muitas palavras dentro de cada palavra.
Inclusive as que não falamos, eu não diria principalmente.
Faz pouco tempo, mas, parece tanto.
Mesmo distante, parece tão perto.
Que de tão livre, preso.
E de tão preso, verso.
Pierre Tenório
sempre com muito cuidado
pra não encostar os poros
nem sequer olhos nos olhos
todo veneno da pele
que distante/perto dele
é gasto como perfume
numa faca cheia de gumes
na ânsia de perfurar
o medo de conjugar
verbos numa canção
tema de ficção
livres como tatuagem
permanecendo contidos
a contemplar o perigo
na inútil tentativa
de cicatrizar feridas.
Pierre Tenório
para fugires do frio
bordado com a neblina
que afaga as águas dos rios
roubei perfumes em pétalas
de todos os tipos de flores
colori as tuas unhas
com um pouquinho do céu
e dos cometas as cores
cobri a pele da face
com véu de orvalho das árvores
envolta do teu pescoço
pendurei cadentes estrelas
cortei as asas de um pássaro
para em liberdade vê-la
antes vesti tua mão
com alguns anéis de saturno
te penteei os cabelos
com as pontas dos cinco dedos
reciclei alguns segredos
com rimas achadas no lixo
num temporal de silêncios
já que um dia pediste
para que eu fosse livre
e contemplasse a natureza
que há por detrás das cercas;
por fim, confundi teus óculos
com raios caídos do sol
diretamente nos olhos
foi quando então decidi
tornar-me cego, infeliz.
que todo adeus seja belo
Pierre Tenório