terça-feira, 27 de outubro de 2015

lo-fiques

queria contar nossa história
em alta definição

mas, tudo será gravado
por um radinho de mão.

Pierre Tenório

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

perdi todo o medo que sentia das palavras quando comecei a ouvir o silêncio gritando pra eu ficar longe em sussurros ao pé do ouvido ganhei coragem pra enfrentar ausências e perigos somos conchas carregadas pelas ondas do destino que inventamos no ouvido pensante, nunca aprendi a pedir perdão mas sempre que seguro sua mão e nossos caminhos se cruzam nos meus olhos opacos o desejo de viver se reaviva mesmo cuspindo a cada ressaca pedacinhos de nós dois inexistentes se há sempre despedidas sempre haverão ultimatos.

Pierre Tenório

terça-feira, 13 de outubro de 2015

pensei que fosse fácil
escrever um poema
e comecei a escrever
vários poemas fáceis

sem pensar em nada

qualquer coisa era um poema
bastava estar impresso

ou impressionar

depois eu nem falava sobre a fome
nem sobre a ditadura

pensei que escrever um poema
fosse apenas ser
o protagonista
da carta de amor

que bebe uma taça
de orvalho esperando
o bem-me-quer
mau-me-quer

e morrer por isso.
agora

não consigo escrever porra nenhuma
apago tudo quanto penso que acabo
e continuo sem saber de quase nada

leio pra evitar ficar sozinho
não depilo as pernas
gosto como pelos aquecem
e enfeitam o corpo

apelo para que a canção
me deixe
dormir

entendo por fim que o poema
é um grito;

e tem gente que vive calada
escrevendo nos olhos
dos outros

poemas fósseis.

Pierre Tenório




quinta-feira, 1 de outubro de 2015

plantou um belo jardim
na varanda da minha casa

para que pudéssemos sentar
e do nada criarmos asas

mobiliou toda a sala
com os móveis de todo nada

na cozinha um fogão
e geladeira lotada

o quarto era a perfeição
para a nossa solidão

e sobre completa mesa
muitas latas de cerveja

para podermos assim
semearmos todo fim

dos começos que inventamos
na embriaguez que nos amamos.

Pierre Tenório

domingo, 27 de setembro de 2015

existe um redemoinho dentro de mim
inerte dentro dele
pacifico minhas vontades

tudo pode existir

nossas visões
sobre as coisas.

os anéis de saturno
entre os dedos

é tudo que você pode
me dar;

não respondo as perguntas
no entanto, me encontro

dentro do teu cu,
enquanto os ossos
pensam.

Pierre Tenório


quinta-feira, 24 de setembro de 2015

é quase hora de dormir
e a garota bêbada
fecha todas as portas

meio cansada de tudo

ajeita a cortina da janela
para caso a luz divina
ouse buscá-la pela fresta;

ela olha sentada na cama
para as capas dos livros que já leu
acende algumas vezes o isqueiro

apaga a luz e arregala os olhos
aperta as teclas do telefone

incomodada com a luminosidade
ela gosta mesmo é do silêncio

aceso

das frases desconexas
que pairam pelo pensamento,
pensa até em arranjar um emprego

sente o cheiro das cédulas
e decide gastar todo tempo

fazendo tempestades
em copos de álcool;

não há hora pra acordar
quanto mais se sonha.

Pierre Tenório

terça-feira, 22 de setembro de 2015

estar num palco é
protagonizar o poema
além de comer o coração dele,
ser maldito, desnudo
encarnado e condenado
ao mergulho de outros

arrancar a alma da poesia;

assistir-se ao lado de dentro
estar num palco é ser não sendo.

sinceramente não compreendo
nenhuma letra que fora escrita
neste âmago por tua língua

nossos corpos fétidos
encharcados não recuaram,
teus líquidos a sede do corpo
saciaram embriagando-me todo

sinceramente não admito
teres me raptado a alma,
disso não me conformo

nossos corpos alinhados
nossos órgãos em comum
ossos dóceis não fugiram do afago
as memórias que me cospem forte a face.

quando digo que te amo
e você me retribui
com flechadas e pancadas
tiros, bombas de palavras
silêncios, facadas imaginárias
cara feia, risinho tranquilo

quando dizes que não sabes
se é nunca mais ou sempre;

me convenço que nasci unicamente
para amar ser tua putinha,
a putinha que desprezas loucamente
a putinha que te imagina como não és

e te apaga quando risca na parede
com os ponteiros arrancados do relógio
versos irreversíveis e sem tempo,
falas de um texto improvisado;
a putinha que espera temerosa
o silêncio do despertador.

interpretar a putinha que te ama
é sobretudo ser o palco que enganas.

onde estou?

Pierre Tenório